Aprender com os erros

Mariana Aldrigui, Dr.
3 min readMay 24, 2021

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Publicado originalmente em HotelierNews — 08 de maio de 2021

Desde o início da pandemia de Covid-19, o que se viu (e principalmente ouviu) sobre o turismo brasileiro foi uma coleção de chavões e expressões repetidas, a eterna e incansável ode ao potencial (nunca realizado) do país, e a manifestação de uma leitura pouco conectada com os fatos do mundo real em que vivem os consumidores e, especialmente, os formadores de opinião.

Mais uma vez se comprovou que, em momentos de crises amplas, as atividades ligadas ao turismo são as primeiras a serem impactadas e as últimas a retornarem em toda sua capacidade, e dessa vez não será diferente.

O que, no entanto, chama a atenção, é o tamanho da desinformação nas esferas de decisão — notadamente nos âmbitos estadual e federal, e a consequente oferta de soluções frágeis e muitas vezes sem articulação com outros setores.

De maneira bastante simplificada — o sonho do empresário padrão vinculado ao turismo brasileiro é que tudo volte a ser como era antes, um desejo eterno e nostálgico de retorno no tempo, e com isso (quem sabe!) apagar as ameaças que a tecnologia oferece. Mas isso não vai acontecer, por diversas razoes:

- o país tem um mercado doméstico que sustenta a economia do turismo, porém há um cenário de agravamento da crise econômica, aumento dos preços de itens importantes no orçamento doméstico (o que compromete o orçamento para o lazer), e não é possível estruturar planos de longo prazo em cenários de incerteza, especialmente com a perspectiva de reforma tributária afetando fortemente o setor de serviços, já tão prejudicado;

- enquanto se dá muita visibilidade ao turismo de lazer, que é relevante para muitos destinos, negligencia-se a discussão fundamental sobre o turismo de negócios que está presente em muito mais cidades, que envolve gastos diários por pessoa significativamente maiores e ativa um volume mais consistente de empresas e profissionais, especialmente quando se trata de viagens para reuniões e eventos; empresas que pagam por estes custos foram tão vítimas da pandemia quanto as empresas do turismo, e já reduziram (ou cortaram totalmente) o orçamento de viagens e reuniões em função da praticidade das reuniões remotas (e do fato de que muitos profissionais de fato aumentaram sua produtividade em trabalho remoto);

- na falta de políticas claras de fomento ao setor, vão sendo oferecidas migalhas (como a oferta de pouco mais de R$ 6 bilhões em créditos quando as perdas são no mínimo 10 vezes maiores), e especialmente os pequenos empresários não conseguem acesso ao recurso pela impossibilidade de prever seus resultados futuros e já não dispor mais de garantias a oferecer.

Ser otimista é característica do brasileiro, mas não é recomendável neste ano e sob as circunstâncias em que o país se encontra. Quanto mais cautelosos forem os empresários, observando os movimentos da economia, a evolução da vacinação, e os padrões de consumo das famílias, melhores serão suas decisões. Projetar ao menos três cenários e se organizar para meses ainda muito difíceis é uma opção segura.

Aprender com os erros também, especialmente na hora de escolher representantes políticos com competências para seus cargos e que não nos envergonhem nacional e internacionalmente, manchando nossa imagem e comprometendo negócios futuros.

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Mariana Aldrigui, Dr.
Mariana Aldrigui, Dr.

Written by Mariana Aldrigui, Dr.

Travel & Tourism specialist. Keynote speaker on T&T subjects. Tourism researcher at University of Sao Paulo (Brasil).

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